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Arthur Ituassu

Juntando os cacos (das eleições 2018)


PT Bolsonaro não foi eleito pelo PT, mas pelos que nele votaram. No entanto, fica mais uma vez a sensação de que o PT pensou antes no partido do que no país. Se tivesse pensado no país, teria se inserido em uma plataforma de esquerda mais ampla antes do primeiro turno. Uma aliança PSB-PDT-PT em torno de um candidato fora dos quadros do PT teria sido muito mais forte para contrapor a ultradireita. Isso era notório antes do pleito e, mesmo assim, o PT resolveu apostar alto, com a insistência na candidatura Lula e com a indicação posterior de um candidato próprio. Nesse sentido, o PT é um dos atores responsáveis, mesmo que indiretamente, pela eleição de Jair Bolsonaro. Segundo pesquisa do Datafolha antes do segundo turno, 25% dos votos em Bolsonaro estavam motivados pela rejeição ao PT. Lula e os estrategistas do partido apostaram na rejeição ao candidato de extrema-direita e acabaram entregando o país a ele. Ao fim, a rejeição ao PT era maior. PSDB Apesar das vitórias em São Paulo, Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul, o PSDB está entre os grandes derrotados dessa eleição. Viu sua hegemonia como opção ao PT desmoronar. Além disso, sua unidade e identidade correm risco com a eleição do conservador João Dória em SP e a vitória de governadores em estados onde Bolsonaro obteve ampla maioria (MS e RS). Em Minas, onde a extrema-direita não foi tão forte, Anastasia, um quadro moderado e importante do partido, foi derrotado. O PSDB acabou engolido pelos ultraconservadores, que destoam da história e da trajetória de Mario Covas, Fernando Henrique Cardoso, Paulo Renato de Souza e José Serra. A derrocada começou, como bem afirmou Tasso Jeireissati, figura histórica da agremiação, em entrevista ao Estado de São Paulo, quando o partido, sob comando de Aécio Neves, questionou o resultado das eleições de 2014 e se aprofundou na aventura do impeachment. Com isso e os escândalos de corrupção (envolvendo especialmente o político mineiro), o PSDB histórico parece ter ficado para trás, com o partido se tornando apenas mais um no espectro conservador, como o PP ou o PSD. Na bancada eleita para o Congresso, o PSDB terá 29 deputados (20 a menos que na bancada atual), o PP terá 37 e o PSD, 34. Com o enfraquecimento de PT e PSDB, pode ter sido sepultada uma era de social-democracia, que proporcionou ao país uma série inegável de avanços. ELITE Segundo o Datafolha, Bolsonaro tinha 61% dos votos dos eleitores mais ricos, às vésperas do segundo turno, muito provavelmente em função da alta rejeição ao PT nesse segmento. Entretanto, se a elite se saiu vitoriosa no pleito, com a derrota do partido de Lula, a eleição de um político historicamente considerado caricato na política fluminense e nacional, para dizer o mínimo, mostra que esse segmento social oferece muito pouco (e muito mal) ao país, com a falta de um projeto nacional mais amplo e inclusivo. Nesse contexto, nem mesmo se encaixa o projeto do Partido Novo, que deu apoio imediato a Bolsonaro e elegeu um governador que, como o capitão reformado do Exército, andou faltando a debates no segundo turno, algo democraticamente vergonhoso. Um projeto nacional de elite envolve mais do que um projeto de elite, como é o Partido Novo ou mesmo Bolsonaro. O problema disso é histórico, nenhuma nação do planeta se desenvolveu sem um projeto de nação de uma elite esclarecida e comprometida com interesses e prazos mais amplos do que os seus próprios. SEGURANÇA

Engana-se quem acha que a economia será a pauta principal do governo Bolsonaro. A meu ver, o tema principal dessa gestão será segurança (ou você acha que o presidente prefere os holofotes em uma questão que assumidamente pouco entende?). Nesse sentido, os adversários políticos da extrema-direita brasileira deveriam estudar o que aconteceu na Colômbia, onde a violência foi controlada por conservadores em aliança com os paramilitares, o que garantiu enorme capital político a Álvaro Uribe. O presidente eleito já deu declarações a favor de milícias, defendendo inclusive a legalização desses grupos. Alguém duvida que hoje no Brasil o cidadão em geral gostaria de ver essa questão melhor resolvida seja quais forem os métodos utilizados? Esse é um tema que pode dar enorme capital político à extrema-direita, o que garante risco de grandes retrocessos no plano dos valores, da educação e da cultura. Lula teve oportunidade de lidar com esse tema, em 2002, quando tinha em mãos um projeto junto com Luís Eduardo Soares, nomeado na época Secretário Nacional de Segurança. Abandonou o projeto e o especialista. INTERNET Não há dúvidas que o Brasil mudou de patamar com relação à comunicação política em campanhas eleitorais, passando para o que alguns autores chamam de campanha pós-moderna (Pipa Norris) ou hipermidiática (Philip Howard), sem sequer passar pela percepção mais positiva desse processo diante das campanhas de 2008 e 2012 de Barack Obama. Caímos diretamente nisso em um momento em que a apreensão com relação à democracia é grande, no que concerne a determinadas práticas. Desinformação (fake news), comunicação hiperindividualizada (o que enfraquece noções mais estruturais e não tanto agregadoras de público), polarização, echo chambers, discursos de ódio, influência externa, tudo isso hoje está no centro da comunicação política brasileira em período eleitoral (e talvez até mesmo fora dele). Nesse contexto, a Justiça parece completamente despreparada e, mesmo que iniciativas como a de fact-checking sejam louváveis, pode ser que o único antídoto verdadeiramente eficaz seja uma estrutura educacional forte que envolva uma postura crítica-racional em relação à informação digital, desde a infância, como já estão fazendo alguns países, algo muito distante da precária situação brasileira. Nesse contexto também, o Brasil entrou para o rol de locais afetados por um movimento sistêmico populista digital de extrema-direita, que passou pela votação do Brexit, de Trump, e tem em Steve Bannon talvez seu símbolo mais forte. Esse tipo de movimento não precisa de partido e não precisa mais do jornalista, para se comunicar com o cidadão. INSTITUIÇÕES

A partir de hoje, o futuro da democracia brasileira estará mais dependente das instituições e isso talvez não seja uma boa notícia. Já há algum tempo que o jornalismo e o Poder Judiciário, por exemplo, de uma forma geral, têm exercido um papel institucional questionável, atuando até, para alguns autores, como elementos desestabilizadores da democracia no Brasil. O partidarismo excessivo, o desrespeito a regras institucionais básicas e a falta de autocontrole formal não só alimentaram a extrema-direita como têm, de uma certa forma, corrompido a credibilidade dessas instituições. A garantia da democracia são instituições fortes e que cumpram com rigor seu papel institucional, esse talvez seja o projeto que a liberdade mais demanda hoje ao contexto brasileiro.

Foto: Agência Brasil.


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