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  • Arthur Ituassu

Internet e a cultura da participação


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Sociedade civil promove iniciativas digitais para o acompanhamento das eleições 2014

Uma das promessas mais comentadas da internet para o dia a dia das democracias é a de proporcionar uma mudança na cultura política de menos passividade e mais participação dos cidadãos. Afinal, um comportamento significativamente passivo do cidadão em relação à política nos regimes democráticos contemporâneos já vem há algum tempo sendo observado, em vários contextos diferentes.

Um dos efeitos mais notórios disso é a queda generalizada no comparecimento eleitoral. Nos Estados Unidos, por exemplo, o comparecimento às eleições presidenciais oscilou entre 58% e 63% da população apta a votar entre 1952 e 1968, quando se inicia, a partir daí, uma curva descendente até o índice de 47% em 1996.

O efeito é sentido mesmo em regimes que tradicionalmente apresentaram índices altos de participação nas eleições. Até 1986, na Holanda, o comparecimento eleitoral raramente esteve abaixo dos 80%, entre os aptos a votar. Em 1998, no entanto, ficou próximo dos 70%.

No contexto brasileiro e sul-americano, em geral, o tema deve ser relativizado para a situação do voto obrigatório. Sobre esse ponto, por exemplo, um caso citado com recorrência é o da Venezuela, que modificou sua legislação eleitoral em 1993, eliminando as penalidades previstas para os faltosos. Após a mudança na lei, a média de 90% de comparecimento caiu para níveis próximos a 60%.

No caso do Brasil, a questão da “ausência eleitoral” ainda apresenta algumas nuances. Enquanto a maior parte da população acima de 18 anos deve se alistar obrigatoriamente, aqueles entre 16 e 18 anos e os analfabetos (ou algo em torno de 20% da população) têm direito facultativo não somente ao voto quanto ao próprio alistamento eleitoral. No caso específico dos jovens entre 16 e 18 anos, por exemplo, a faixa etária compôs 4% do eleitorado em 1989, quando pôde participar pela primeira vez de uma eleição, e apenas 1,78% em 1998. Em 2008, após uma intensa campanha da Justiça Eleitoral, voltada para o alistamento eleitoral deste público, os jovens entre 16 e 18 anos passaram então a somar 2,51% do eleitorado nacional. Em 2014, o índice chegou a 1,1% do eleitorado.

Ainda, além dos jovens, há também o caso dos maiores de 70 anos que, apesar de aptos, exercem a prerrogativa do comparecimento facultativo. Não à toa, alguns autores utilizam, para o contexto brasileiro, dois tipos de abstenção, a “técnica” e a “real”. Enquanto a primeira tem a intenção de verificar quantos não comparecem às urnas dentre aqueles que estavam aptos a votar, isto é, os registrados, a segunda verifica a ausência em relação ao conjunto total de aptos a votar – o “eleitorado potencial”, ou seja, todos aptos a se registrar. Dessa forma, fica claro que o índice técnico tende a ser sempre menor que o “real”, dado que indivíduos alistáveis que não se registraram colaboram para a subavaliação da ausência eleitoral.

De qualquer modo, é possível identificar uma queda expressiva mesmo no índice de comparecimento entre os alistados nas eleições presidenciais brasileiras: 85,6%, no segundo turno em 1989; 82,3%, em 1994; e apenas 78,5% em 1998. Nos pleitos seguintes, os números praticamente se repetem. No segundo turno das eleições de 2002 para presidente, por exemplo, houve uma abstenção técnica de mais de 20%, quase 2% de votos em branco e aproximadamente 4% dos votos foram anulados. Nas presidenciais de 2006, a abstenção técnica foi novamente em torno dos 20%, com quase 5% de votos anulados. Em 2010, no segundo turno, o Tribunal Superior Eleitoral registrou uma abstenção técnica em torno de 21% (comparecimento de 78,5% entre os registrados), com 2,3% de votos em branco e 4,4% de votos anulados.

Várias das causas para a passividade cidadã, representada na queda do comparecimento eleitoral, são originadas, segundo a literatura especializada, da comunicação de massa tradicional. A mídia tradicional, calcada no sistema few-to-many, tornaria o cidadão mais passivo ao transformá-lo em um mero espectador e consumidor da (hiper)realidade política mediada pelos sistemas midiáticos. Além disso, a função consolidada de watchdog (cão de guarda) do jornalismo nos regimes democráticos contemporâneos, somada à busca de audiência com escândalos (novelescos) de corrupção, trariam a conseqüência indesejada da descrença generalizada na atividade política.

Nesse sentido, a internet é apresentada como um meio capaz de romper como uma comunicação política que promove um cidadão mais passivo que participante. Seus custos baixos de produção e seu alto potencial interativo, afinal, permitem uma atuação cidadã mais efetiva que a de um mero consumidor de informação.

No contexto de eleições no Brasil, algumas iniciativas parecem colaborar com a tese. No Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), um estudante criou um aplicativo que avalia propostas dos presidenciáveis, onde o eleitor pode “votar” ou “vetar” cada proposta, criando um ranking dos perfis. Da mesma forma, no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), da Uerj, o “manchetômetro” é uma iniciativa na Web que faz o acompanhamento diário da cobertura das eleições 2014 na grande média, especificamente nos jornais Folha de S. Paulo, O Globo e Estado de S. Paulo, e no Jornal Nacional da TV Globo. No Twitter, @Meu_Rio promete fazer um "polígrafo digital" durante o primeiro debate para governador do Rio, adiado para terça, 19/08.

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