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Arthur Ituassu

O fim de uma era conservadora

Nova nomeação de Trump consolida transformação do Partido Republicano


"Essa é realmente a questão diante de nós esta noite: pela primeira vez em nossa memória, muitos americanos estão se perguntando: a história ainda tem um lugar para a América, para seu povo, para seus grandes ideais? Há alguns que respondem não; que nossa energia está esgotada, nossos dias de grandeza chegaram ao fim, que uma grande melancolia nacional paira sobre nós."


O trecho retirado de um pronunciamento de Ronald Reagan feito em 3 de novembro de 1980, durante seu último comício de campanha antes da eleição presidencial do mesmo ano, abre o mais novo anúncio da organização Eleitores Republicanos Contra Trump (Republican Voters Against Trump - rvat.org). A campanha de 50 milhões de dólares traz um vídeo narrado por Reagan e milhares de testemunhos de republicanos insatisfeitos com o domínio de Donald Trump sobre o Grand Old Party (GOP), como é conhecido o Partido Republicano, nos Estados Unidos.


A escolha de Reagan não é à toa. Esse foi o presidente que no Portão de Brandemburgo, próximo ao Muro de Berlin, em junho de 1987, discursou: "Gorbachev, se você busca a paz, se você busca a prosperidade para a União Soviética e para o Leste Europeu, se você busca a liberalização, venha até este portão. Gorbachev, abra este portão! Derrube este muro!" Nesse momento, o governo Reagan, sempre visto com idolatria pelos republicanos, tinha três pilares centrais: uma política externa agressiva de defesa da democracia, apoio incansável ao comércio internacional e conservadorismo social no campo dos valores.


Hoje, o Partido Republicano não poderia estar mais diferente. No campo da política externa, Donald Trump flerta com Vladimir Putin e o autocrata húngaro Viktor Órban. Sob o seu comando, o GOP age para dificultar a ajuda militar americana à Ucrânia. No âmbito do comércio internacional, Trump defende uma plataforma nacionalista que tem a China e os produtos chineses como alvo principal. No campo dos valores, já se declarou a favor dos planos estatais de saúde e previdência, algo impensável para um republicano na época de Ronald Reagan.


Essa transformação, que se consolida na segunda nomeação de Donald Trump como candidato à Presidência americana, produziu um partido menos conservador e mais radical. Em uma pesquisa feita na última primária em New Hampshire, somente três em cada dez republicanos se autoconsideraram “moderados”. Recentemente, ex-assessores de Trump divulgaram que ele, quando em ambiente privado, costuma elogiar ditadores e autocratas, inclusive Adolf Hitler, que teria feito “algumas coisas boas”.


O modelo bipartidário americano sempre foi visto como uma garantidor de moderação. A multiplicidade de processos internos que um candidato teria que passar para chegar a uma nomeação à Presidência, por exemplo, serviria de filtro contra potenciais aventureiros. Assim, em uma época em que os partidos tradicionais se veem em xeque em muitos países, o domínio de Donald Trump sobre o Partido Republicano parece ser não mais que uma versão americana de um fenômeno global.

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